segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

O Vencedor - Capítulo 14

O Vencedor 

Capítulo 14


“Abel mora aqui. O amigo é convidado dele. Quem precisa ir é você.”  

“Acho que eu consigo conviver com o povão mais um pouco. Não faz tanto mal assim.  

“Não.” Era engraçado ver o imperador que morava na voz de Maurício se dirigindo a outra pessoa. Me arrepiava mesmo que não fosse pra mim. Era de uma brandura odiosa e fria. Falava num tom como se sua voz fosse a lei que todos estavam esperando pra obedecer. 

Você precisa ir.” Tão bom em ser maior, o todo lorde. E as pessoas todas encolhiam e escolhiam se avassalar às suas afirmativas definitivas, augustas.  

O primo de Eliza, vale lembrar nessa hora tão dramática, olhou de Maurício para a prima, muda e com oolhos esbugalhados. Ele se levantou e saiu, bastante dignamente com o queixo arrebitado, sem falar mais nada. Que ser humano era aquele? Eu, hoje, acho até engraçado.  

“Me desculpem por isso.” Maurício disse aos seus convidados. "Fiquem à vontade a casa é de vocês."  

Ele veio tão decidido na nossa direção que eu achei que ia apanhar, ou coisa assim.  

"Me desculpa." Olhou no olho de Fernando apenas pra desferir o meio aceno de cabeça, grave e cordato. Nada mais que isso. Só o necessário pra mostrar que era bom anfitrião, que era fino, nobre. É que é muito comum as pessoas confundirem altivez com nobreza. Mas o lorde inglês pra inglês ver era ainda uma opção muito mais preferível do que o fogo que me queimou pelo segundo inteiro em que nossos olhos se encontraram.  

"Giulia, eu vou subir." Pegou na mão dela. "Se quiser ficar lá comigo, se achar que deve ir pra casa, se quiser ficar. Faz como você decidir. Se entende com Abel aí. Foi mal."  

"Relaxa. Vou ficar aqui um pouquinho comentando o bafão e depois vou pra casa." Maurício soltou uma risada curta, mas sincera.  

"Maurício." Eliza chamou indignada, ele já estava na metade da escada e parou pra olhá-la. 

"Você expulsou o meu primo?" Ela era burra? Precisava de um programa inteiro do Telecurso pra explicar pra ela?  

"A gente pode conversar isso sozinho." Se virou e a deixou lá.  

"Cara, você tá bem?" Giulia lembrou de Fernando. Eu tinha esquecido, saboreando a expressão de atriz indicada, mas não premiada na cara de Eliza. "Nada a ver esse garoto."  

" tranquilo." Não estava 

"Quer sair daqui?" Eu perguntei.  

"Acho que é bom."  

"E eu? Hein?"  

"Espera um pouquinho." Fernando disse. "A gente só vai se despedir." 

"Hein?" Fui seguindo Fernando que parecia precisar sair daquela casa e chegar aonde pudesse respirar.  

"Ah, eu não  mais à vontade aqui. Aliás, já não tava. E esse cara", apontou pro andar de cima, "é um bocado estranho, parece um robô." Eu acabei gargalhando ainda meio trêmulo. 
"Vai que ele resolve entrar numa comigo? Não sei."  

"A gente fica lá fora."  

"Eu prefiro ir mesmo." 

"Não liga não, viu?" Uma das meninas do bufê colocou a mão no ombro de Fernando.  

"Valeu." Ele balançou a cabeça. "Quer ir comigo?"  

"Tá. Não, pera. Minha mãe."  

"Claro. Verdade. Ele leva se precisar?"  

"Leva sim. Ele só não tava em casa. A gente fica um pouquinho no carro, conversando?"  

"Poxa, quero ir embora."  

"Ganho um beijo?" Ele sorriu murcho, mas me beijou. Também murcho. 

"Não liga praquele idiota. O que ele sabe da vida? Nasceu rico e nunca teve que fazer nada pra isso. Vive do que o pai fez. Não deixa gente assim desmerecer você." Agarrei-o com fogo. 

"Você é bom, lindo, honesto e gostoso." Beijei de novo. Isso pareceu deixá-lo um pouco mais alegrinho. 

"Tchau."  

"Tchau. Me avisa quando chegar."  

Fiquei olhando ele ir me sentindo culpado, mas cruzei o portão e só pensava em Maurício.  

"Olha, a Eliza subiu também, então eu acho melhor falar pro pessoal debandar. O que acha?" Giulia me esperava na cozinha. 

"Bem, faz como você decidir. Ele que disse."  

"Então é isso. Galera, olha, acho que o clima de festa já era, né? Nossos anfitriões devem estar discutindo ou vai ver pularam essa parte e já estão fazendo as pazes. Em qualquer dos dois casos, eles não precisam da gente aqui, né? Vamos curtir em outro lugar?"  

As pessoas pareceram agradecidas de que alguém tivesse tido a coragem de falar aquilo. Um a um, foram saindo sem maiores transtornos, para a Glória de Deus Pai. Amém.  

"Nossa! Que noite." Ela disse.  

"Ai."  

"E o Fernando? Ficou bem?"  

"Mais ou menos. Tava meio chateado."  

"Não é pra menos."
  
"É."  

"Olha, eu também vou. Não quero estar aqui quando essa briga chegar aqui embaixo."  

"Tá bom. Eu vou ficar, não tenho outro jeito."  

"Fica no seu quarto, bobo. Sai do meio desse fogo. Beijo. 

"Tchau."  

"É... Abel?"  

"Oi."  

"Será que a gente pode ir, então?  

"Acho que sim, né? Não tem mais festa." 

"O que a gente faz com isso tudo?" Os quitutes, inúteis agora, pareciam até um coral que insistia em cantar mesmo que pra nenhuma plateia.  

"Ai, leva com vocês? Leva e finge que nada aconteceu. Vai estragar se ficar aqui."  

"Tá. Só vou esperar o carro vim buscar a gente."  

"Fica à vontade. Não tem pressa."  

Eu precisava de um remédio pra dor de cabeça. Muita estranha a atitude de Maurício, ficar daquele jeito. Eu tentava imaginá-lo compadecido por Fernando ao ponto de ficar naquele estado, mas não conseguia. Não fazia o perfil dele. Não estava neste nível de empatia com os demais seres humanos. Só podia haver uma razão pra tudo aquilo. E uma razão que não tinha nada a ver com o primo expiatório de Eliza.  

Maurício devia estar querendo gritar era comigo, me colocar pra fora, me escorraçar na frente de todo mundo e o que o deixava louco era que não tinha, de fato, um motivo para fazer isso. Eu não tinha obrigação nenhuma para com ele e por mais que ele não soubesse disso, eu era livre pra sair com quem eu quisesse. Assim como ele.  

Só podia ser isso: estava descontrolado porque eu tinha alguém. Vai entender. Não me queria, não me procurava, gozava e me mandava embora. Agora, dava ceninha de ciúme velado?  

Fui ver minha mãe que era o melhor que eu fazia. Ela estava dormindo feito um anjo. Fiquei lá por um tempo. A TV estava num canal em que passava "Cisne Negro". Estava bem na parte em que ela mata a outra que é ela (spoiler alertOops! Tarde damais.) e eu esperei pra ver a parte do cisne negro, propriamente dito e quando a plateia começou a jogar-lhe flores, eu perdi o interesse e voltei pra fora.  

Como Deus é bom. Fiquei lá só pelo tempo necessário para que Maurício e Eliza passassem feito duas balas, segundo a moça, em direção à porta da rua. Ele devia ter ido levá-la e, provavelmente ia se perder pela noite e só apareceria no meio da madrugada.  

"Vou trancar meu quarto." Pensei.

Ajudei as meninas a carregarem o carro que veio buscá-las e mal íamos terminando, Maurício chegou.  

Me olhou com Satanás dentro do corpo e entrou em casa.  

As despedi e voltei pra dentro. Pela cozinha,  porque eu não sou bobo, mas de nada adiantou. Ele estava bem mesmo sentado num dos bancos da ilha central. Um copo de whisky à sua frente. Ele bebia e olhava pra mim, o rosto mais lindo do mundo, com cara de azedo, que tinha raiva e repulsa pra contar 

"Você tinha que colocar esse cara aqui dentro?"  

"Desculpa. Eu sei que essa é sua casa e eu só moro de favor aqui, mas ele veio só socorrer minha mãe."  

"Eu não falei disso." Fez questão de descer o tom da raiva pra, de novo, mostrar que era nobre demais, dessa vez, nobre demais pra me dizer que eu sou só o filho da empregada e não posso receber ninguém.  

"Então, falou do quê? Porque você e sua namorada convidaram ele pra ficar. Qual é a sua queixa, então?"  

Ele bebeu mais. Eu consegui ver as palavras brigando para sair de seus lábios trancados. Não conseguia falar. Eu não conseguia esperar.  

"Eu vou te dizer qual é sua queixa. Eu não estou mais lá disponível pra você gozar quando quer. O seu problema é que eu decidi não ser mais o seu depósito de porra. 

Ele levantou. Os olhos frios fixos em mim, eu o adorava. Adorava ser o alvo dos olhares dele, mesmo daquele, principalmente daquele. Era o dono, o cruel, vindo pra cima de mim. Contra aquele, eu não tinha chance, eu me vencia, lutava na guerra contra mim mesmo, vencia e entregava a cidade pra ele.  

Maurício parou no meio do caminho. Pensou por um instante e se virou a ir embora. Como ele podia ser tão orgulhoso? Sempre tendo que ganhar. Quando eu achava que estava  um passo à frente, com ele contra a parede, ele me pega e me sai da conversa?  

"Você volta aqui." Eu disse, tendo aprendido com ele, e parecia que ele também andava aprendendo comigo porque parou e olhou pra mim. Eu não tinha nada pra dizer, só queria que ele voltasse. Queria que ele dissesse alguma coisa.  

Meu olhar aflito me entregava, contava que eu estava morrendo de medo dele desaparecer dali, medo de que ele deixasse claro que não se importava ao ponto de ficar e lidar com o estresse da discussão. Eu só queria que ele ficasse, meus olhos gritavam. Que me tomasse nos braços porque eu era dele.
  
Ele não disse nada. Só veio na toda pra cima de mim, outra vez achei que ia apanhar, mas isso estava muito abaixo dele. Recuei até ficar imprensado entre a geladeira e ele, que grudou o corpo no meu e levou a mão na minha bunda me puxando pra si por ela. Estava bruto, uma besta. Besta que eu amava, que eu queria e temia. 

"Vai me estuprar?" 

Ele parou assustado, como se tivesse levado um tapa, mas subiu em si de novo muito rápido. 

"Vou?" Os lábios tão perto dos meus que chegaram a se tocar quando ele perguntou.  

Continua...  

33 comentários:

  1. Por favor mais um por favor
    Um presente para seus leitores apaixonados !

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    1. Não tenho controle sobre o aparelho celular que uso. Nem sempre posso atender a esses pedidos aqui. Gostaria, mas não dá.

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  2. ABEEEEEEEEEEEEEL, POR FAVORRRR! Posta dois capítulos de uma vez, pra retribuir o que faltou na quinta! Ou pelo menos capítulos maiores, POR FAVOR! Não aguento mais esperar.
    -J.A

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    1. Vocês vão jogar essa quinta na minha cara pra sempre? rs
      Eu também fico ansioso pra contar tudo. Vamos aguentar juntos.

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  3. Ai Abel, coração chegou na boca agora. Concordo com o
    J.A, posta um maior ou 1 a mais vai. Tp muito ansioso pelo próximo cap heheh

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  4. vc gosta de me torturar com essa ansiedade de ter logo o próximo capítulo

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  5. Minha nossa, que tesão de conto. Abel te imploramos para lançar outro capítulo

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  6. Meu Deus, sempre fico na ansiedade de ver a continuação. Já quero amanhã.

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  7. Rapaz... Faz isso com a gente não. Sabemos de suas dificuldades, mas agora que nos encantou, tens conosco uma responsabilidade, "pois te tornas responsável por tudo o que cativas" (risos sem graça). Não nos deixes a ver navios nas horas aflitas de espera por mais um capítulo. Grande abraço. E. K.

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    1. Sim, me sinto responsável pela ansiedade de vocês aqui, por isso me esforço pra vir todo dia. Obrigado pelo carinho e por ter se deixado cativar. Minha história vai com você pra onde quer que for agora.

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  8. Bicha a senhora e destruidora meixmo deveria estar rica

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    1. kkkkk
      Obrigado. Me ajuda com isso. Divulga o blog. Um dia, quem sabe?

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  9. Agora consegue o que quer certeza disso

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  10. Cara, posta capítulos maiores ou dois de uma única vez, não consigo esperar tanto para ler outro dia, estou louco por essa história.

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    1. Não tenho muito tempo pra escrever e postar. É bem rápido e ainda me pressionam pra acabar logo. Queria escrever mais e contar mais, mas não dá tempo.

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  11. Meu Deus, não vejo a hora de Maurício baixar a guarda dele de durão. Que venha o próximo capítulo.

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  12. Respostas
    1. Ah, Abel, em tuas mãos insidiosas se encontra pura literatura...
      Apaixonado por sua escrita.

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